Storytelling: Norah Jones – Little Broken Hearts (2012)

segunda-feira, 7 de maio de 2012
NOTA: 8.5/10
BLUE NOTE / EMI
Little broken hearts of the night
Slowly picking up their knives
On the way to the fight
Tonight they want revenge
(“Pequenos corações quebrados da noite, lentamente pegando suas facas, no caminho para a guerra. Esta noite eles querem vingança”).

Depois de terem trabalhado juntos no álbum Rome, de 2011, Norah Jones e o produtor Brian “Danger Mouse” Burton voltaram aos estúdios para completar o trabalho já iniciado em 2009, um projetado de novo álbum, antes mesmo de The Fall ir ao mercado. Little Broken Hearts foi lançado no dia 1º de maio de 2012.
Sendo um dos melhores produtores do mundo, era de se esperar que ele soubesse trabalhar com a voz peculiar de Norah, e ela de trabalhar com os arranjos de Burton. Feito com maestria, aliás. Muito diferente de tudo que Jones já fez, como o próprio Burton já disse, o álbum reúne sintetizadores, vocais distorcidos, e uma neblina, algo que me remete a uma esfera etérea. Os arranjos de Burton realmente dão uma profundidade emocional às letras e a voz de Norah.
O álbum funciona bem como um todo, nos conta uma historia que cada musica separada não consegue completar. Cada musica tem sua trama própria, mas se encaixa no álbum como um todo, como um cenário maior. Pequenas historias num cenário maior, o álbum segue como uma narrativa de acontecimentos, sem medo ou pudor de serem expostos nomes, lugares ou situações.
O conceito abordado é a ruptura, o término de relacionamentos, e as reações –sim, diversas reações– que se tem quando acontece conosco, e não se sentir preparado para deixá-lo ir. “Sempre ouvi historias velhas de como se escreve melhor quando se passa por coisas ruins. É horrível, mas é verdade!”, com a palavra, Norah, que não surpreendendo diz ter passado por um termino recentemente.
Norah e Burton parecem querer nos seduzir com uma atmosfera esfumaçante, de escultura elegante, que consegue cobrir a dor da ruptura, do mal-fadado relacionamento. Ouvindo superficialmente, não se capta a essência do álbum, apenas o clima, os assuntos.

A capa do álbum foi inspirada em um pôster do filme Mudhoney, que estava preso à parede do estúdio de Brian Burton, onde o álbum foi gravado, pôster esse que Norah diz ter encarado todo o tempo de gravação.

Apesar de ser um álbum sobre término, a intenção não é só mostrar apenas uma das reações. Temos o suave falsete com sintetizadores e uma melodia angelical de Good Morning, a musica que abre o álbum de forma despretensiosa, repetindo com uma espontânea ternura “I’m folding my hand”, quase uma canção de boa-noite, enquanto ela se dá conta de que está se apegando a uma mão perdida, no jogo; enquanto que Say Goodbye, que logo a segue, é a primeira demonstração de inquietação e angustia com os trechos contraditórios “I won't let you die until come back (...) It's alright It's okay, I don't need you anyway, apesar de cantar despreocupada e quase alegremente que vai embora.

A musica que da o titulo ao album nos leva a enxergar de frente como cada um de nós se porta diante dessa situação. A tristeza, a melancolia que passa de um estado para sermos só aquilo. Quando aquilo toma conta de nós, e que não precisa ser assim, aliás, não deveria. Did the darkness of their days make them let go of their light? Will they want to find a way to make it all right? “.

Uma tristeza não tão encrustada na pele, como descrita em Little Broken Hearts, a música (afinal, Norah em momento algum soa tão deprimida quanto descreve o estado na música) podemos ver em She’s 22. Retrata um affair do homem que até então a faz feliz com uma terceira pessoa, uma mulher nos seus 22 anos de juventude, e como ele nunca saberá o quanto isso a deixou triste. Nem ele nem os ouvintes saberão, por ela demonstrar que o que sentiu foi muito além. Are you really happy?, Does she make you happy? e I’d like to see you happy são 3 das profundas frases que compoe não só essa gravação como o disco por inteiro.

Take It Back, uma das mais sinceras do album, quase nos faz enxergar pelos olhos de Norah. A realização do estado que se encontra, de que não vai passar tão cedo, que ‘ele’ não vai voltar atrás. Won't you take me away from here So I'll never find my way home”. As pistas que são dadas durante o caminho para esse estado, e que só conseguimos enxergar quando já estamos lá. E que ainda pode piorar. “And dust can turn into mud”.

Como se estivesse olhando para as fotografias tiradas, em After the Fall Norah Jones se pergunta se depois de tudo o que passou, ele ainda iria querer tudo de volta; relembra de como os pensamentos eram diferentes e apenas depois que fora perceber. Para no fim, revelar: “After the fall, I still want it all “. Travellin’ On conta sobre uma viagem metaforica, que parece ser em direção a onde ‘ele’ já estaria indo, porém ele se encontra muito a sua frente, e Norah o “tranqüiliza”: “Hey, don't be too hard on yourself, I'll be okay. 'Cause we won't leave this place any worse than when we came “.

4 Broken Hearts remete a uma historia desastrosa na qual tudo o que restou foram 4 corações quebrados, 4 pessoas machucadas. E como ela se fecha, “criando novos muros, mas tendo a certeza de deixar uma janela para ele voltar dessa vez”.


Happy Pills e Miriam se assemelham na forma mais agressiva de se expressar, apesar de terem um estilo completamente diferente quanto a melodia e suavidade. Enquanto a música Happy Pills expõe a raiva de ter se enganado e de não querer nem mais ver o cara, o videoclipe mostra uma traição à Norah, e como ela se vinga, confrontando a amante por telefone e em um dos passeios de Norah e seu amado, o deixa inconsciente e empurra seu carro para dentro do lago. Miriam por sua vez consegue ser mais agressiva e vingativa, mesmo com toda a sua suavidade e aparente leveza. É de uma frieza ímpar que Norah canta “Miriam, that's such a pretty name. And I'll keep saying it, until you die. Miriam, you know you done me wrong. I'm gonna smile when you say goodbye. You know you done me wrong, I'm gonna smile when I take your life”, tanto que consigo imaginá-la afiando uma faca enquanto canta, com a expressão mais serena possivel. E quem nunca se sentiu assim?

Em uma outra viagem metaforica, em Out On The Road, uma de minhas favoritas, a cantora parte despreocupadamente, dessa vez em direção a um destino que ela ainda não sabe, mas sabe que saindo de onde se encontra as coisas começam a melhorar, já no caminho. On my way to paradise a little voice says: "Don't think twice and don't look back if you want things to change" “.

É como se ao partir ela nao fizesse ideia de para onde estivesse indo, e já no caminho ela soubesse que estaria no caminho certo, e o destino, que nos foi mostrado na ultima canção do álbum, All A Dream, na qual ela segue seu caminho, dizendo que “as nuvens nunca mais reaparecerão” e que “finalmente acorda”. Sabemos que ela chega lá. Que ela consegue reverter essa situação com a inocência e certo controle sobre seus sentimentos. E que por mais que ela seja Norah Jones, ela sente tudo o que sentimos num termino. A diferença é que expõe tudo em um álbum intimista ao extremo, tal como sincero sem pretensões ou se importar com o que iriam pensar dessa crueza, dessa exposição de sentimentos. A atmosfera etérea criada pelos arranjos de Burton nos faz pensar em um sonho, como se tudo não passasse disso. Talvez para nos distrair da situação como ela realmente é, talvez para dar a impressão de que seja mesmo um sonho e que aquilo não estivesse acontecendo. Uma coisa é certa: não há uma musica ruim no álbum, e não dá para ouvir uma só separadamente e entender do que se trata, é como se fosse um filme. Cada canção é uma cena, uma cena daquele filme que você torce, se confunde e odeia com a protagonista. Um prato cheio para os que gostam de certa alternatividade e mudança de planos. Vale a pena não só ouvir, mas apreciar cada musica do álbum. E aprovar a mudança de Norah.

And how long does it take
To fight off this weakness?
And tell him
To guard me
‘Cause God knows I’m sorry”.


3 comenta(m):

  1. MaryGrizotto disse...:

    Gostei muito do álbum, mas confesso que fiquei um pouco surpresa com que escutei. Em 10 anos de carreira a Norah conseguiu explorar todas a vertentes possíveis da musica.
    Eu a descobri, em momento em que precisava ter esperança foi quando ouvi Come Away With Me. Hoje ela é a cantora numero 01 no meu coração.

    A cada cd ela ressurge como uma Nova Norah,mas ainda sim a mesma Norah. Passando em suas cancões, o cotidiano humano.
    Little Broken Hearts é o lado 'dark' e menos romântico dela. Quando ouvi Happy Pills pela primeira vez foi meio um choque.
    Mas como você disse as melodias suaves fazem com que você quase não note os dramas passados nas letras

  1. Anônimo disse...:

    Não curto muito Norah Jones, mas ouvirei esse álbum. Confio no seu bom gosto rs. E, nem precisa dizer, mas já dizendo, acho ótimo como você escreve, seu lindo! bjs

    Monique Furtado

  1. Anônimo disse...:

    Você escreve super bem. Adorei os trechos que você foi colocando enquanto ia falando de cada musica, me deu vontade de ouvir todas. (Guilherme)

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